segunda-feira, 18 de abril de 2011

Cicloviagem Rio - Resende

Reproduzo aqui e-mail recebido do Eduardo Bernhardt do Transporte Ativo. Ele faz parte de uma galera admirável que luta pelo que acredita, no caso o transporte por bicicleta, como forma de melhorar a vida nas cidades.

O Eduardo fez o percurso Rio-Resende de bicicleta e relatou a experiência. Como eu lido com segurança no trânsito, não posso deixar de alertar para os riscos de acidente neste tipo de viagem, mas se todos os cuidados forem seguidos dá pra chegar em segurança. Algumas dicas do Eduardo neste sentido: "É fundamental acompanhar o trânsito atrás de você e os espelhos que existem no mercado são péssimos. Portanto é preciso olhar para trás e 'ler' o trânsito. Mas a regra de ouro é a palavra 'visibilidade'. A imensa maioria dos acidentes (no verdadeiro sentido da palavra) ocorre com ciclistas 'invisíveis'. Eu pedalo de roupas claras, uso refletivos nos tornozelos, no quadro e nas rodas. Uso colete refletivo na cor laranja ou verde-limão que me faz visível a pelo menos mil metros de dia ou de noite. Faróis e pisca traseiro forte sempre com pilhas novas são imprescindíveis à noite."

Segue o ótimo e-mail:
"Em dezembro de 2006 fiz uma cicloviagem entre o Rio de Janeiro e Resende (180 km). Na época pedalava uma bicicleta reclinada recém-adquirida. Sem estar adaptado, nem tão pouco treinado encarei a Dutra mesmo assim e aprendi muito com o lado bom e o ruim daquela empreitada. Desde aquela época esta viagem estava para ser repetida, mas nunca foi por absoluta falta de respeito próprio, já que devemos nos esforçar para realizar aquilo que sonhamos. Os anos passaram, assim como muitos quilômetros de estrada em cicloviagens, Audax e treinos. Me fascinava a máxima expressão da liberdade e desprendimento de um ciclista que, num belo dia saiu de casa para treinar e resolveu transformar um dia de pedalada em três. Voltou pra casa feliz e realizado com uma cicloviagem não programada que deve ter sido inesquecível.


Planejar e se preparar é a regra para quem quer viajar por aí pedalando sua magrela, mas quantos hesitam diante das incertezas, medos e preocupações,  geralmente infundadas e nunca começam? Nunca é tarde, mas a leitura de alguns relatos podem inibir aqueles que se acham incapazes de juntar dinheiro, planejar, se estruturar e marcar a data.


Pois este relato espera mudar isso, ou pelo menos fazer um convite à reflexão sobre as falsas amarras que nos impedem de viver os sonhos, aproveitar a vida e usufruir da humanidade.

Na quinta-feira decidi que sexta iria pedalando do Rio de Janeiro a Resende, onde teria, no sábado, um casamento de família. E mais, iria trabalhar de manhã, partindo depois do almoço. A Carol, minha esposa, levaria a minha bagagem e isso meio que descaracteriza uma cicloviagem, já que não levei tudo o que precisaria para o fim-de-semana. Mas não importa, cicloviagem, treino ou mesmo loucura como muitos podem pensar. Importante é viver as experiências e não teorizar sobre elas.


Almocei no trabalho mesmo, uma hora depois do planejado e parti às 14:00, sol quente e barriga cheia. Tudo errado né? Não acho. Errado seria usar tais limitações como desculpa para não partir. Não é o meu caso. Saí então devagar e escolhi uma rota com sombras para chegar à Avenida Brasil. Esqueci de mencionar que estava em minha bicicleta single speed (marcha única) o que para muitos seria a cereja do bolo da insanidade, mas que revelou-se um bolo de racionalidade muito gostoso.


A Brasil é desagradável, mas até nisso tem um lado muito bom. Trânsito pesado, engarrafado, calor e poluição tentam inibir a pedalada, mas na Dutra eu sabia que teria um acostamento largo e lisinho até Resende. Aproveitando o grande trecho plano, a primeira puxada foi longa e pedalei sem parar até o Belvedere no km 80, dali em diante começariam umas subidas e a inquietante serra das Araras. É que antes de sair de casa fiquei na dúvida se trocava a catraca de 14 dentes que estava no cubo traseiro pela de 15 dentes, mas amigável para subidas. No fim, fui como estava para 'ver qual é'. Subo bem com a de 14 dentes, mas não aguento muito tempo pedalando em pé e a Serra das Araras tem 6 ou 7km. Não sei bem pois não uso mais um ciclocomputador. Velocidade, distância, média, não acompanho nada disso e não sinto falta.
No pé da Serra escureceu e mais adiante um pouco esfriou de leve.Ótimo! Bem melhor que em 2006 quando cheguei ali na hora mais quente. Fui em pé até onde deu, mas como fico me repetindo o mantra "pedale como um velho, chegue como um jovem", logo que comecei a cansar desci e empurrei. Fiz isso mais uma vez depois de parar em um quiosque para beber água de coco e refrescar a cuca numa bica de água-da-serra. Antes que eu imaginasse a Serra acabou e me alegrei, pois a escolha de manter a catraca 14 estava confirmada como a melhor opção. Dali foi quase um passeio, com o sobe e desce sendo percorrido de maneira deliciosa. Parei mais quatro vezes, sempre rapidamente. No total foram cerca de 60 minutos de paradas para o fundamental.


Como de praxe nas cicloviagens nossa cabeça divaga e dessa vez a minha resolveu responder à pergunta fatídica: porque ir de bicicleta nessa viagem? E ainda por cima à noite! Estamos acostumados a buscar segurança e estabilidade em nossas vidas, acreditando que ali está a base para a realização e felicidade. Bem, pode ser que ajude, mas descobri que viver momentos de vulnerabilidade, como quando se pedala na estrada, ajuda a valorizar os momentos de 'tranquilidade'. Mais ainda ajuda a renovar a crença na humanidade, de que ainda há bondade e solidariedade no mundo. Não levei corrente ou cadeado para amarrar a bicicleta, mas sempre há alguém disposto a tomar conta da sua bicicleta, de verdade. Um destes guardiões ainda me deu a dica de água gelada e de graça num bebedouro enorme no posto de gasolina da parada. Sensacional! Frequentei essa parada por anos e nunca soube desse bebedouro gigante. Posso assumir também que cada motorista que piscou os faróis e buzinou de leve ao me ultrapassar estava, de certo modo, cuidando de mim. Dezenas fizeram isso e nunca os vi antes. Depois de 9 horas e meia cheguei ao meu destino sem as dores de cinco anos atrás e com mais certeza de que viajar de bicicleta é bom demais e que você tem que  experimentar um dia, nem que seja uma pedalada bem planejada, acompanhada, curta e numa estrada secundária. Pode nascer ali um cicloviajante que vai curtir estradas asfaltadas e de terra sem receio de ser feliz."

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